Que af Klint não chamasse a sua obra "Arte abstrata", é suficiente para que alguns historiadores da arte a desqualifiquem como obra da primeira artista abstrata.
De fato, af Klint pintava seus quadros abstratos muito antes de que Wassily Kandinsky fizesse a sua progressão das paisagens à abstração ao redor de 1910, ou Robert Delaunay abandonou o neoimpresionismo pelo orfismo e depois se meteu na arte abstrata um ou dois anos mais tarde.
Mas esses homens eram membros de grupos artísticos volúveis e Kandinsky era um advogado que conhecia a importância da autopromoção. A diferença de Klint, que trabalhava só, em isolamento, e estipulava que sua obra de arte não se exibiria até vinte anos após a sua morte. Af Klint morreu em 1944.
De fato, foi preciso 42 anos para que o seu trabalho fosse visto pelo público como parte de uma exposição intitulada The Spiritual in Art in Los Angeles em 1986.
E aí está o problema. Em um mundo secularizado em que qualquer coisa que "faça menção à espiritualidade" é considerado irrelevante, desprezível e geralmente sem importância, foi difícil para af Klint ser vista como algo diferente a uma artista estrangeira ou uma nota de rodapé pelos homens que levaram todo o mérito.
Claaaaro, uma grande parte da culpa disso deve recair na própria Klint e sua proibição de exibir sua obra. É uma grande pena, porque essa proibição autoimposta significou que embora af Klint poderia ter sido a primeira artista abstrata, seu fracasso para compartilhar seu trabalho ou exibi-lo significou que ela não teve influência através de seus esforços artísticos.
Mas agora que af Klint foi redescoberta, tem gente que acredita que este seja o momento adequado para romper com a velha história da arte sobre Kandinsky e Delaunay e todos os outros, e começar de novo com af Klint na raiz dessa "árvore abstrata".
Hilma af Klint
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Hilma af Klint |
Diferente de hoje, as crenças religiosas e a investigação científica não eram mutuamente exclusivas. Da mesma maneira, havia (naquele momento) um interesse científico no espiritual.
Af Klint era uma apaixonada pelas matemáticas, pela botânica e pela arte. Algumas de suas primeiras pinturas foram exames detalhados das plantas. Seu pai tinha pouco entendimento da paixão de sua filha pela arte e lamentavelmente movia negativamente sua cabeça quando ela se entusiasmava com a pintura.
Af Klint estudou retrato e paisagem na Academia de Belas Artes de Estocolmo de 1882 a 1887, se gradundo com honras. Suas pinturas eram extraordinariamente boas e tecnicamente muito refinadas, mas não extraordinárias e nem ofereciam muito do que estava por vir.
"As Cinco"
O ponto de inflexão para essa grande mudança, surgiu com a morte de sua irmã menor em 1880. Af Klint se uniu a um grupo de mulheres que compartilhava um interesse pelas teorias espirituais, especificamente, as teorias ocultas e as ideias teosóficas de Madame Blavatsky que promoviam uma união entre o científico e o espiritual.
Essas mulheres, que ficaram conhecidas como "As Cinco", celebraram sessões de espiritismo junto de af Klint, que com frequência, ela atuava como médium. Sob sua direção, essas mulheres começaram a produzir obras criadas através do que chamavam de escritura e pintura automáticas, quase quatro décadas antes de que os surrealistas reivindicassem inventar tal estilo.
Foi através do seu contato com os chamados "Altos Mestres" que af Klint começou sua série de pinturas abstratas em 1906. Ela afirmou que as imagens pretendiam representar:
"O caminho para a reconciliação da espiritualidade com o mundo material, junto de outras dualidades: fé e ciência, homens e mulheres, bem e mau".
Af Klint detalhou suas conversas com o que chamavam de espíritos, incluindo um chamado Gregor que teria dito a ela:
"Todo o conhecimento não é dos sentidos, não é do intelecto, não é do coração, mas é a propriedade que pertence exclusivamente ao aspecto mais profundo do seu ser [...] o conhecimento do seu espírito."
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Hilma af Klint |
"Amaliel assina um rascunho, depois deixa que H pinte. A ideia é produzir um núcleo a partir do qual a evolução se baseia na chuva e na tempestade, os relâmpagos e as tempestades. Então vêm nuvens de chumbo."
Entre 1906 e 1915, af Klint produziu um total de 193 pinturas e uma avalanche de milhares de palavras que descreviam suas conversas com os "Altos Mestres" e o significado de suas pinturas. Seu trabalho representava a dualidade simétrica da existência como homem/mulher, material/espiritual e bom/mau.
O azul representava o feminino. Amarelo o masculino. Rosa significava o amor físico. Vermelho denotava amor espiritual. O verde representava a harmonia. As espirais significavam evolução. As marcas que pareciam com um "U" representavam o mundo espiritual. Enquanto ondas ou um "W" o mundo material. Círculos ou discos significavam unidade. Af Klint acreditava que estava criando uma nova linguagem visual, uma nova forma de pintar que unia o espiritual e o científico.
"Um Templo"
Essas pinturas com frequência tinham mais de três metros de altura. Ela pintou seus quadros no chão (Uma que outra pegada sua, podem ser vistas manchadas nas telas). Af Klint trabalhou como se estivesse possuída. Ela acreditava que seu trabalho tinha a intenção de estabelecer um "Templo", o que esse templo era ou significava, era que nunca estava exatamente certa. Tudo o que Klint sabia era que estava sendo guiada supostamente por espíritos:
"Os quadros foram pintados diretamente através de mim, sem desenhos preliminares e com grande força. Não tinha nem ideia do que se supunha que iam representar as pinturas; no entanto, trabalhei rápida e seguramente, sem mudar nem uma só pincelada."
Ao longo de tudo isso, af Klint continuou sua própria e rigorosa investigação sobre novas ideias científicas e esotéricas. Isso a levou à obra de Rudolf Steiner, que seguia um caminho similar para a criação de uma síntese entre o científico e o espiritual.
Quando af Klint mostrou seus quadros ao grande esotérico, Steiner se escandalizou e disse a ela que aqueles quadros não deveriam ser vistos até dentro de cinquenta anos, já que ninguém os entenderia. A resposta de Steiner devastou a af Klint e ela deixou de pintar durante quatro anos.
Af Klint passou um tempo cuidando da sua mãe cega e moribunda. Depois voltou à pintura, mas se resguardou e o que é mais importante, seu trabalho foi removido do mundo.
Após a sua morte em 1944, o celeiro alugado onde mantinha o seu estúdio ia ser queimado pelo dono do local. Um parente rapidamente empacotou todos os quadros e cadernos de af Klint em caixas de madeira e os guardou em uma cobertura com teto de latão durante os próximos trinta anos.
Em 1970, as pinturas de af Klint foram oferecidas à Moderna Museet (Museu de Arte Moderna) de Estocolmo, que surpreendentemente (alguns diriam tontamente) foram recusadas.
Felizmente, graças à perseverança de sua família e do historiador de arte Åke Fant, a obra de af Klint finalmente foi exposta na década de 1980. Ao todo, Hilma af Klint pintou mais de 1.200 pinturas abstratas e escreveu cerca de 23.000 palavras, todas elas propriedade da Fundação Hilma af Klint, que as gerencia.
The Ten Largest #3 (1907)

The Ten Largest #4 (1907).

The Ten Largest #7. (1907).

The key to the work up to this point #5 (1907).

Altarpiece #1 (1907).

The Swan #17 (1914).

Doves #2 (1915).

Sem título, sem data.

Evolution (1908).

Hilma af Klint em seu estúdio.

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